Abstract
A Grande Recessão de 2008 e a implementação de políticas de austeridade aceleraram as transformações em curso nos Estados-providência europeus. Este projeto envolve o tema proeminente da natureza dos regimes de bem-estar de austeridade emergentes no sul da Europa. Especificamente, visa problematizar a dependência excessiva de estruturas de medição para definir e avaliar o bem-estar social e individual; e a crescente influência de abordagens comportamentais na formulação de políticas. Este projeto propõe uma abordagem comparativa bottom-up do ‘cálculo do bem-estar humano’ e da ‘sustentabilidade do bem-estar’, com foco na relevância teórica do conceito de 'mundos quotidianos de bem-estar'. O conceito de mundos quotidianos de bem-estar abrange o conjunto histórico e local de práticas, éticas normativa de subsistência e argumentos de valoração popular que informam como as famílias e os indivíduos definem e perseguem modalidades de satisfação de necessidades tangíveis e intangíveis (ou seja, recursos e reivindicações) necessárias para garantir a sustentabilidade da subsistência intergeracional. Com base num enquadramento teórico interdisciplinar baseado na antropologia económica, sociologia e economia feminista, este projeto examinará como as pessoas comuns experienciam, produzem, negociam e conceptualizam mundos quotidianos de bem-estar, no seio de, e através diversas escalas regulatórias de provisão de bem-estar. O trabalho de campo será realizado em Portugal e Itália, comparando histórica e etnograficamente as relações entre as reconfigurações económicas dos agregados familiares, estratégias de subsistência individuais e interacções com instituições mediadoras (estatais ou não) de provisão social. Recentemente, com a intenção de abordar a incapacidade da economia mainstream em prever a Grande Recessão de 2008 e as falhas nas respostas políticas, os economistas Stiglitz, Fitoussi e Durand propuseram uma 'beyond-GDP agenda' para definir e medir o bem-estar com foco no modo fatores locais afetam os padrões distributivos e de sustentabilidade; as desigualdades intrafamiliares e as experiências valorativas das pessoas sobre insegurança de meios de subsistência, privação de cidadania e percepções de desigualdade. Com base na 'beyond-GDP agenda', que informou a Agenda 2030 adotada pelas Nações Unidas em 2015, este projeto contribui para a promoção de indicadores socialmente inclusivos de prosperidade económica e bem-estar, avaliando criticamente os indicadores quantitativos e pressupostos comportamentais que orientam definições dominantes sobre necessidades, valor social e direitos. Reforçará, assim, a contribuição crucial do conhecimento antropológico e da evidência de base qualitativa na construção de uma política social de bem-estar social mais justa, inclusiva e sustentável no contexto da recuperação e renovação pós-pandemia.