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eSefarad: modalidades e práticas de patrimonialização digital do legado cultural sefardita em contextos mediterrânicos

Investigador responsável: Pedro Antunes

Grupo de investigação: Circulação e Produção de Lugares


Palavras-chave

Judaísmo | Património Digital | Diáspora Sefardita | Religião-ciência-política

Instituição financiadora

Fundação para a Ciência e a Tecnologia

Estado

Fechado

Data de início

01-09-2022

Data de fim

28-02-2025

Referência

UID/04038/2020


Abstract

A cultura sefardita faz hoje o centro de um fenómeno de revitalização cultural do judaísmo no mediterrânico, no sul da europa, abrangendo processos de musealização e patrimonialização de sinagogas ou de rotas da diáspora judaica. Entre as diferentes formas de revitalização destaca- se o ‘património cultural digital’ e o envolvimento cívico destas comunidades com as tecnologias digitais em práticas locais de salvaguarda do legado cultural sefardita. A par da digitalização de coleções de museus ou da criação de sistemas digitais de aprendizagem da língua judaica-espanhola, o ladino, podemos hoje visualizar na internet um conjunto diversificado de canais e redes documentação audiovisual – tal é o caso do canal digital de notícias eSefarad.com, que dá mote ao título deste projeto. Descrições interpretativas, registo fílmicos ou fotográficos, ou relatos histórico-culturais produzidos pelos elementos de comunidades sefarditas configuram hoje uma forma contemporânea de fazer património, que tem a especificidade de ser digitalmente constituído. Notando uma lacuna no estudo do património cultural digital pretende-se com este projeto perceber que novas configurações epistemológicas estão a ser hoje concebidas e implementadas a partir das tecnologias digitais, e o seu potencial no restabelecimento redes culturais transnacionais. Coloca-se, então, seguinte questão central (provisória): no seu envolvimento afetivo e simbólico de revitalização de um património judaico-sefardita diaspórico – vinculado às memórias difíceis do anti-semitismo – que usos e significados adquire o ‘digital’ para as comunidades judaicas?

Este projeto propõem-se indagar antropologicamente a 'digital turn' no património através de uma investigação comparativa dos seguintes casos de patrimonialização: (i) a salvaguarda digital da língua judaico-espanhola, o ladino, mais concretamente através do acompanhamento do projeto “Judeo-Spanish: connecting the two ends of the Mediterranean”, em colaboração com o Centro Sefardita de Istambul – o qual compreende o desenvolvimento de sistemas de aprendizagem linguística audiovisuais, a criação de uma central de dados digitais, de aplicações de tradução automática e síntese de voz, e workshops sobre preservação de línguas minoritárias; (ii) o processo de digitalização da coleção de “Judaica” do Museu Judeu da Grécia em Atenas e a agregação dos artefactos religiosos desta coleção na plataforma Europeana (Europeana.ue), uma iniciativa desenvolvida pela Comissão Europeia; e, for fim, (iii) a constituição da coleção permanente do futuro Museu Judaico de Lisboa, Tikva, incluindo a observação dos processos de recolha, documentação e eventual digitalização de bens patrimoniais a integrarem a coleção, bem como a sua respetiva curadoria.

Tikva, a palavra hebraica para «esperança» que dá nome a este futuro museu, surge aqui como uma forma de exprimir o “trabalho de memoria” conduzido pela comunidade judaica em Lisboa na “desocultação” do património do “judaísmo português”. Para uma compreensão da orientação patrimonial deste projeto museológico, há que pô-lo em relação com um conjunto mais alargado de processos de musealização de memórias invisibilizadas e/ou difíceis, isto é, perceber o lugar deste futuro museu a partir da linha de problematização contemporânea de estudos do património. Destaca-se aqui, pelo caracter inovador da sua conceção e pelas práticas de curadoria experimental, o POLIN Museu of the History of Polish Jews, em Varsóvia, cuja exposição permanente foi curada por Barbara Kirshenblatt-Gimblett.

O contributo para compreensão do ‘digital’ enquanto ferramenta de preservação, revitalização e patrimonialização do legado cultural sefardita passará aqui, necessariamente, pela análise comparativa de sistemas de digitalização, acesso e transmissão de conhecimentos, incluindo o estudo da cultura material e as práticas heurísticas envolvidas no ensino-aprendizagem de uma língua em desaparecimento. Há́ ainda que considerar que no processo de digitalização são criados metadados – informação sobre os objetos ‘físicos’ que estão a ser digitalizados – o que nos coloca um segundo desafio, questionar: até que ponto a digitalização confere valor aos ‘objetos’ digitalizados? Numa vertente mais epistemológica, importa notar que tal como os estudos críticos do património abordaram criticamente as conceções, valores e os usos do património, este projeto pretende também pensar criticamente no ‘património digital’; com o presente projeto coloca-se assim um terceiro desafio: quais são preocupações e soluções práticas que estão hoje a ser pensadas e/ou implementadas para a seleção e salvaguarda do património que está a ser constituído digitalmente?